Aposto que você consegue se lembrar bem rápido de pelo menos dois brinquedos de sua infância. Não é por acaso. O brinquedo é muito importante na vida do bebê e da criança. Além de ser quase uma extensão de seu corpo, ficam guardados na memória para sempre. Há diversos tipos: educativos, eletrônicos, pelúcias, bonecas, automotivos… E por aí vai. A psicóloga Vera Zimmerman nos mostra que todos, sem exceção, estimulam o cérebro da criança. Saiba as vantagens de cada um e escolha em que loja passar!
O ser humano constitui sua vida psíquica, o que inclui o emocional, o perceptivo, o motor e o cognitivo via relação com o mundo – tanto nas relações com outros seres-vivos, quanto com objetos. Para as crianças, os objetos em questão são os brinquedos. É através do conceito de brincar que você pode incluir na vida do seu filho experiências, tanto passivas, quanto ativas, que possibilitem desenvolver seu corpo e motricidade.
Primeiro ano de vida
É no primeiro ano que a criança começa a vivenciar sons, cores e texturas. Nessa fase, os brinquedos ideais são os móbiles, os chocalhos, os movimentos e as músicas, que estimulam os sentidos.
O corpo da mãe, que remete à criança as sensações de segurança, carinho e prazer também pode ser substituído por bichinhos de pelúcia e mordedores macios – que dão a impressão de que a mãe não se afastou.
A percepção de que as pessoas e os objetos desaparecem de seu campo visual ensina à criança as noções de presença e ausência, ou seja, a separação e a perda, fundamentais para a vida toda. As brincadeiras alimentadas por esse aprendizado são as de brincar de ‘esconder’. Primeiro com paninhos que a mãe esconde seu rosto e depois evoluindo para diferentes formas, como esconde-esconde, procurar objetos e cabra-cega (quando estiver mais velho).
Nessa idade, a criança também descobre diferentes superfícies. Primeiro, percebe que o corpo da mãe possui curvas, buracos (a criança adora colocar o dedo no nariz, boca e ouvido da mãe), percebe o cabelo e unhas. Depois, percebe as diferentes topologias dos objetos e passa a gostar de brincadeiras novas, como colocar um brinquedo dentro do outro, abrir e fechar portas e gavetas ou entrar nos móveis. Descobre que entram e saem coisas do seu corpo – tudo que pode servir para ele executar o dentro e fora lhe dará prazer. Pode ser o armário de panelas ou latinhas simples que cabem uma dentro da outra, não importando a sofisticação do brinquedo, mas a possibilidade desse tipo de exploração. Todos esses brincadeiras desenvolvem a criança em todos os sentidos.
Segundo e terceiro anos de vida
Nessa idade a criança começa a perceber a funcionalidade dos objetos e a primeira situação que ela acha interessante está ligada à alimentação: pratinhos com talheres lhe dão a satisfação de representar uma cena familiar e a sua capacidade de simbolizar se inicia.
Aqui também começa a repetição de cenas prazerosas, que representam a diversidade de seres-vivos. Manusear fantoches de animais, por exemplo, ensinam as diferenças das formas e sons deles; e manusear fantoches de pessoas os faz identificar, na brincadeira, os avós, os pais, irmãos e os amiguinhos.
Assim que começa a caminhar descobre outras maneiras de se divertir. A mobilidade lhe dá prazer imenso, pois já pode acompanhar, com certa funcionalidade, brinquedos que se movimentam, como carrinhos e trens.
No segundo e terceiro anos de vida as crianças também contam com outro ótimo estimulante, os livros – considerados brinquedos importantes por trazerem o jogo de cenas e cores, aspectos que as fazem brincar com os sentidos, a cognição, a coordenação motora e a emoção.
Quarto e quinto anos de vida
Em torno dos quatro e cinco anos a criança já se insere nas regras do brincar, mas ainda não as compreende. Para entendê-las, pode ser de forma simples, com jogos a dois, brincadeiras com bola, atividades com materiais pedagógicos, todas em que tenha de esperar sua vez para jogar e que determine que ela tenha de cumprir e obedecer a ordens. Dessa forma, começa a ter de perceber que existe o outro e este quer ser respeitado na sua vontade também.
É também nessa idade que surgem, aos poucos, os heróis para os meninos – simbolizando a preocupação com a força e os vínculos identificatórios com os adultos. Brincar com isso é começar a sonhar com a possibilidade de crescer e vir a ser como esses adultos que admira e nos quais sente proteção. As meninas, predominantemente, passam a gostar do funcional das bonecas. Cuidam, fazem cenas familiares onde representam os cuidados femininos com os filhos e iniciam o jogo identificatório com a figura materna. Também podem expressar o que sentem com esses cuidados e executam situações vividas em suas casas, permitindo-se elaborar sentimentos, o que representa uma saída da passividade para uma vida imaginária de adulto.
Os jogos virtuais, brincados individualmente ou não, também são importantes e passam a fazer parte da vida da criança aos quatro anos, em média. São importantes, pois desenvolvem habilidades perceptivas, motoras, cognitivas e emocionais.
Brincar sozinho e brincar com os outros
É muito importante brincar sozinho e ter espaço para criar, fantasiar suas realidades e dar formas singulares para as brincadeiras. Se o adulto não respeita esse espaço está tolhendo mecanismos de resolução dessa criança e, consequentemente, bloqueando sua capacidade de elaboração e adaptação ao mundo, ou seja, enfraquecendo-o.
Mas, com a escolaridade, abrem-se muitas oportunidades diferentes para o brincar. O coletivo passa a ter uma presença mais forte e, com ele, as regras, o virtual, o grupo e a alfabetização.
Começam a acontecer as brigas para permanecer dono das regras, pois, ao sentir que tem poder, a criança passa a gostar dele – exemplo disso é a admiração por controles remotos e por ser o mandante em jogos coletivos. É necessária a imposição de limites para que a criança saia do trono e aprenda a viver em grupo.
Cada brinquedo tem seu espaço
É importante perceber que todo brinquedo tem seu espaço na infância. O mais importante é perceber que seu filho está progredindo ao brincar, seja por estar mais esperto ou por estar mais generoso. As evoluções motoras, psiquícas e emocionais reveladas tanto por um brinquedo elaborado quanto por uma brincadeira na rua são imprescindíveis para o desenvolvimento de crianças melhores.
Agradecimentos
Dra. Vera Zimmerman, psicóloga da Unifesp.
Questões fundamentais
*Quando a criança não brinca, está doente. Isto é definitivo e certo. É preciso investigar e resolver;
*Dosagem: é preciso equilibrar o tempo em que a criança brinca sozinha e brinca com alguém;
*Criar brinquedos e brincadeiras é necessário e natural. Os pais devem se preocupar com a criança que não consegue criar nada;
*Não se deve dar sempre o brinquedo logo que é pedido: o espaço entre o pedir e o ganhar possibilita o desenvolvimento da capacidade de sonhar e criar, vital para a criança;
*Excesso de brinquedo atrapalha a capacidade de escolher e brincar;
*Brinquedos devem evoluir e, conseqüentemente, sair da vida da criança – de preferência, passar para outra criança, que vai aproveitá-lo. Esse desapego desenvolve a capacidade de colaboração e ajuda a olhar para a frente, para o futuro, buscando novos estímulos. Só devem ser guardados aqueles brinquedos muito especiais para ela e, ainda, de forma a sair do seu campo visual após determinado tempo – a criança deve participar desse processo para que seja estimulada a crescer;
*Jogos virtuais podem ser muito estimulantes ao crescimento, mas é preciso ter cuidado com excessos. A criança tem dificuldade para diferenciar a realidade da fantasia e jogos com muita violência ou personagens com nitidez e caracterização humana tendem a confundir a cabeça dela, o que não é adequado para seu desenvolvimento. A descarga de agressão que tem ao ver esses jogos não é adequada e ela precisa resolver seu potencial agressivo;
*Os pais devem oportunizar experiências diferentes e isso não implica em sofisticação de materiais. A motricidade, por exemplo, pode ser exercida tanto em árvores, como num parque sofisticado.
Revista Pais & Filhos