Brinquedos que educam

Edição 437 – Outubro/2006

 

Aposto que você consegue se lembrar bem rápido de pelo menos dois brinquedos de sua infância. Não é por acaso. O brinquedo é muito importante na vida do bebê e da criança. Além de ser quase uma extensão de seu corpo, ficam guardados na memória para sempre. Há diversos tipos: educativos, eletrônicos, pelúcias, bonecas, automotivos… E por aí vai. A psicóloga Vera Zimmerman nos mostra que todos, sem exceção, estimulam o cérebro da criança. Saiba as vantagens de cada um e escolha em que loja passar!

O ser humano constitui sua vida psíquica, o que inclui o emocional, o perceptivo, o motor e o cognitivo via relação com o mundo – tanto nas relações com outros seres-vivos, quanto com objetos. Para as crianças, os objetos em questão são os brinquedos. É através do conceito de brincar que você pode incluir na vida do seu filho experiências, tanto passivas, quanto ativas, que possibilitem desenvolver seu corpo e motricidade.

Primeiro ano de vida

É no primeiro ano que a criança começa a vivenciar sons, cores e texturas. Nessa fase, os brinquedos ideais são os móbiles, os chocalhos, os movimentos e as músicas, que estimulam os sentidos.
O corpo da mãe, que remete à criança as sensações de segurança, carinho e prazer também pode ser substituído por bichinhos de pelúcia e mordedores macios – que dão a impressão de que a mãe não se afastou.

A percepção de que as pessoas e os objetos desaparecem de seu campo visual ensina à criança as noções de presença e ausência, ou seja, a separação e a perda, fundamentais para a vida toda. As brincadeiras alimentadas por esse aprendizado são as de brincar de ‘esconder’. Primeiro com paninhos que a mãe esconde seu rosto e depois evoluindo para diferentes formas, como esconde-esconde, procurar objetos e cabra-cega (quando estiver mais velho).

Nessa idade, a criança também descobre diferentes superfícies. Primeiro, percebe que o corpo da mãe possui curvas, buracos (a criança adora colocar o dedo no nariz, boca e ouvido da mãe), percebe o cabelo e unhas. Depois, percebe as diferentes topologias dos objetos e passa a gostar de brincadeiras novas, como colocar um brinquedo dentro do outro, abrir e fechar portas e gavetas ou entrar nos móveis. Descobre que entram e saem coisas do seu corpo – tudo que pode servir para ele executar o dentro e fora lhe dará prazer. Pode ser o armário de panelas ou latinhas simples que cabem uma dentro da outra, não importando a sofisticação do brinquedo, mas a possibilidade desse tipo de exploração. Todos esses brincadeiras desenvolvem a criança em todos os sentidos.

Segundo e terceiro anos de vida

Nessa idade a criança começa a perceber a funcionalidade dos objetos e a primeira situação que ela acha interessante está ligada à alimentação: pratinhos com talheres lhe dão a satisfação de representar uma cena familiar e a sua capacidade de simbolizar se inicia.

Aqui também começa a repetição de cenas prazerosas, que representam a diversidade de seres-vivos. Manusear fantoches de animais, por exemplo, ensinam as diferenças das formas e sons deles; e manusear fantoches de pessoas os faz identificar, na brincadeira, os avós, os pais, irmãos e os amiguinhos.

Assim que começa a caminhar descobre outras maneiras de se divertir. A mobilidade lhe dá prazer imenso, pois já pode acompanhar, com certa funcionalidade, brinquedos que se movimentam, como carrinhos e trens.

No segundo e terceiro anos de vida as crianças também contam com outro ótimo estimulante, os livros – considerados brinquedos importantes por trazerem o jogo de cenas e cores, aspectos que as fazem brincar com os sentidos, a cognição, a coordenação motora e a emoção.

Quarto e quinto anos de vida

Em torno dos quatro e cinco anos a criança já se insere nas regras do brincar, mas ainda não as compreende. Para entendê-las, pode ser de forma simples, com jogos a dois, brincadeiras com bola, atividades com materiais pedagógicos, todas em que tenha de esperar sua vez para jogar e que determine que ela tenha de cumprir e obedecer a ordens. Dessa forma, começa a ter de perceber que existe o outro e este quer ser respeitado na sua vontade também.

É também nessa idade que surgem, aos poucos, os heróis para os meninos – simbolizando a preocupação com a força e os vínculos identificatórios com os adultos. Brincar com isso é começar a sonhar com a possibilidade de crescer e vir a ser como esses adultos que admira e nos quais sente proteção. As meninas, predominantemente, passam a gostar do funcional das bonecas. Cuidam, fazem cenas familiares onde representam os cuidados femininos com os filhos e iniciam o jogo identificatório com a figura materna. Também podem expressar o que sentem com esses cuidados e executam situações vividas em suas casas, permitindo-se elaborar sentimentos, o que representa uma saída da passividade para uma vida imaginária de adulto.

Os jogos virtuais, brincados individualmente ou não, também são importantes e passam a fazer parte da vida da criança aos quatro anos, em média. São importantes, pois desenvolvem habilidades perceptivas, motoras, cognitivas e emocionais.

Brincar sozinho e brincar com os outros

É muito importante brincar sozinho e ter espaço para criar, fantasiar suas realidades e dar formas singulares para as brincadeiras. Se o adulto não respeita esse espaço está tolhendo mecanismos de resolução dessa criança e, consequentemente, bloqueando sua capacidade de elaboração e adaptação ao mundo, ou seja, enfraquecendo-o.

Mas, com a escolaridade, abrem-se muitas oportunidades diferentes para o brincar. O coletivo passa a ter uma presença mais forte e, com ele, as regras, o virtual, o grupo e a alfabetização.

Começam a acontecer as brigas para permanecer dono das regras, pois, ao sentir que tem poder, a criança passa a gostar dele – exemplo disso é a admiração por controles remotos e por ser o mandante em jogos coletivos. É necessária a imposição de limites para que a criança saia do trono e aprenda a viver em grupo.

Cada brinquedo tem seu espaço

É importante perceber que todo brinquedo tem seu espaço na infância. O mais importante é perceber que seu filho está progredindo ao brincar, seja por estar mais esperto ou por estar mais generoso. As evoluções motoras, psiquícas e emocionais reveladas tanto por um brinquedo elaborado quanto por uma brincadeira na rua são imprescindíveis para o desenvolvimento de crianças melhores.

Agradecimentos

Dra. Vera Zimmerman, psicóloga da Unifesp.

Questões fundamentais

*Quando a criança não brinca, está doente. Isto é definitivo e certo. É preciso investigar e resolver;

*Dosagem: é preciso equilibrar o tempo em que a criança brinca sozinha e brinca com alguém;

*Criar brinquedos e brincadeiras é necessário e natural. Os pais devem se preocupar com a criança que não consegue criar nada;

*Não se deve dar sempre o brinquedo logo que é pedido: o espaço entre o pedir e o ganhar possibilita o desenvolvimento da capacidade de sonhar e criar, vital para a criança;

*Excesso de brinquedo atrapalha a capacidade de escolher e brincar;

*Brinquedos devem evoluir e, conseqüentemente, sair da vida da criança – de preferência, passar para outra criança, que vai aproveitá-lo. Esse desapego desenvolve a capacidade de colaboração e ajuda a olhar para a frente, para o futuro, buscando novos estímulos. Só devem ser guardados aqueles brinquedos muito especiais para ela e, ainda, de forma a sair do seu campo visual após determinado tempo – a criança deve participar desse processo para que seja estimulada a crescer;

*Jogos virtuais podem ser muito estimulantes ao crescimento, mas é preciso ter cuidado com excessos. A criança tem dificuldade para diferenciar a realidade da fantasia e jogos com muita violência ou personagens com nitidez e caracterização humana tendem a confundir a cabeça dela, o que não é adequado para seu desenvolvimento. A descarga de agressão que tem ao ver esses jogos não é adequada e ela precisa resolver seu potencial agressivo;

*Os pais devem oportunizar experiências diferentes e isso não implica em sofisticação de materiais. A motricidade, por exemplo, pode ser exercida tanto em árvores, como num parque sofisticado.

Revista Pais & Filhos

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Dra. Vera Blondina Zimmermann
Dra. em Psicologia Clínica - PUC-SP, Professora afiliada do Departamento de Psiquiatria da Universidade Federal de São Paulo, Coordenadora do Núcleo Bebês com Sinais de Risco em Saúde Mental no mesmo departamento. Membro do Departamento de Psicanálise do Instituto SEDES SAPIENTIAE onde coordena o curso Clínica Interdisciplinar da Primeira infância.

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