Adaptação começa em casa

Jornal Zero Hora – Porto Alegre
Inclusão Escolar
21/04/2008

Escolher a instituição onde o filho vai dar início à vida escolar se torna uma tarefa ainda mais trabalhosa quando o aluno é portador de necessidades especiais. O espaço em que ele vai passar a manhã, a tarde ou o dia inteiro, longe dos pais, e a equipe que o receberá devem estar prontos para atender às necessidades e às limitações impostas pelo problema que a criança enfrenta. Vale para esses casos a mesma regra aplicada aos demais: antes de tomar a decisão, é preciso visitar várias escolas, conversar com direção e professores e conhecer as instalações.

– Infelizmente, mesmo existindo a lei de obrigatoriedade de inclusão, não significa que a escola vai poder dar conta da necessidade da criança. Ou fica um faz-de-conta: faço de conta que meu filho está na escola e a escola faz de conta que incluiu – comenta a psicanalista Vera Blondina Zimmermann, doutora em Psicologia Clínica, gaúcha radicada em São Paulo que esteve em Porto Alegre para uma palestra sobre o tema.

A família precisa readaptar suas expectativas: o que esperava antes do nascimento da criança e o que pode esperar do seu desenvolvimento a partir do diagnóstico. O abalo sentido pelos pais no nascimento ou no momento em que ficam sabendo das limitações do filho, muitas vezes, não é superado, o que só agrava as dificuldades dele. É indispensável pensar que cada indivíduo pode ser importante dentro da sua singularidade e se reorganizar para encarar essa realidade de maneira mais positiva.

O sucesso da experiência escolar começa bem antes do primeiro dia de aula da criança portadora de deficiência. Tudo dependerá de como as limitações que ela tem são tratadas em casa. É fundamental que, desde cedo, as qualidades e as capacidades sejam reconhecidas e incentivadas pelos pais, que devem se esforçar para vencer os seus próprios preconceitos em relação às dificuldades do filho. O pai e a mãe não podem pensar que ele está condenado a uma vida totalmente improdutiva – ao contrário, devem descobrir em que áreas ele pode se destacar, apesar das limitações.

– A escola tem que ser mais uma a apoiar essas características. Às vezes, a família exige que a escola corrija tudo, e é impossível. É um trabalho que começa muito antes da escola. Começa desde o nascimento ou quando surge a dificuldade – comenta Vera Blondina Zimmermann.

Confira algumas dicas da especialista:

É preciso sentir confiança na instituição e na equipe.

Quando a criança está prestes a começar a freqüentar as aulas, é intenso o sofrimento de muitos pais, já predispostos a acreditar que ela não será bem cuidada e recebida. Um comportamento agressivo por parte dos adultos não ajuda em nada a escola que os está recebendo. É importante estar preparado para as mais variadas reações, de alunos e de outros pais.

Informe-se bem sobre a limitação da criança antes de procurar uma instituição de ensino. Se ainda não estão familiarizados com o problema, é importante que a escola possa ajudar a tirar dúvidas e a prestar esclarecimentos, traçando um plano que viabilize a aprendizagem e a integração junto aos demais alunos.

A seleção do colégio dependerá do tipo de dificuldade apresentada. Peça que um dos profissionais que acompanha seu filho em tratamento participe das visitas, para que possa ajudá-lo a avaliar.

Verifique se a instituição dispõe de pessoal capacitado para atender a criança. Motivação e disponibilidade do corpo docente são fundamentais, principalmente durante o período de adaptação. Dependendo do caso, será preciso implementar mudanças no programa pedagógico, para que o aluno possa acompanhar as aulas.

Se a escola não tem experiência prévia com casos de inclusão similares ao do seu filho, verifique se existe a disposição de capacitar funcionários para isso.

Observe bem as instalações do prédio se seu filho tem dificuldades para se locomover. Faça todos os caminhos que ele precisará percorrer para se deslocar entre os diversos ambientes.

Visite várias instituições. É preciso sentir confiança, acreditar que a escola vai assumir a causa junto com a família.

Em parceria com o colégio e os demais profissionais que acompanham a criança ou o adolescente – em muitos casos, trata-se de um grupo numeroso, que inclui fisioterapeuta, fonoaudiólogo etc., estabeleça um programa pedagógico que possa auxiliar a trajetória escolar da criança. Conversem e compartilhem informações sobre o aluno, como se comporta em casa, com quem se relaciona, o que gosta de fazer, que habilidades apresenta. Limitações que, em outras épocas, condenavam o paciente a uma vida ociosa e improdutiva hoje são encaradas de outra forma.

Se seu filho frequenta escola ou classe especial, procure fazer com que, em alguns momentos, com certa freqüência, ele possa conviver com alunos de uma escola regular, onde conviva com um grupo mais heterogêneo.

O período na classe especial deve ser provisório. Faça o possível para que o estudante não seja colocado em um ambiente sem perspectivas de desenvolvimento de suas potencialidades. Não se conforme com programas que não incentivam o crescimento.

Fonte: Vera Blondina Zimmermann, psicóloga clínica, psicanalista, doutora em Psicologia Clínica, coordenadora do Centro de Referência da Infância e Adolescência da Unifesp/Escola Paulista de Medicina e co-autora do livro Singularidade na Inclusão – Estratégias e Resultados (Pulso Editorial)

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Dra. Vera Blondina Zimmermann
Dra. em Psicologia Clínica - PUC-SP, Professora afiliada do Departamento de Psiquiatria da Universidade Federal de São Paulo, Coordenadora do Núcleo Bebês com Sinais de Risco em Saúde Mental no mesmo departamento. Membro do Departamento de Psicanálise do Instituto SEDES SAPIENTIAE onde coordena o curso Clínica Interdisciplinar da Primeira infância.

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