Guia: A hora certa

Revista Veja – Ed. 2161
21/04/2010


É o sonho de todo pai e mãe de primeira viagem: um manual de instruções
para lidar com seu bebê, ou um alarme que avise o instante correto
de avançar para a próxima etapa do desenvolvimento infantil.
Psicólogos e pediatras ouvidos por VEJA são unânimes:
certas mudanças devem, sim, acontecer em faixas etárias específicas.
Anna Paula Buchalla

Guia: A hora certa

É claro que se pode apressá-las ou atrasá-las um pouquinho, em respeito ao ritmo próprio de cada criança – mas sem exageros nem para mais nem para menos. “Não é recomendável, por exemplo, tentar ensinar o filho a segurar o xixi antes dos 2 anos”, explica a pediatra Isabel Rey Madeira, da Sociedade Brasileira de Pediatria. “Ele ainda não tem maturidade neurológica para fazer esse controle”, diz. Com a ajuda de especialistas, VEJA estabeleceu o momento ideal de deixar certos hábitos para trás ou de criar outros desafios na vida das crianças – e na dos próprios pais.

Comer sozinha

Quando: entre 6 meses e 1 ano
Por quê: a partir dos 6 meses, quando consegue levar a mão à boca, a criança já pode comer sozinha pedaços de frutas moles, como banana ou mamão – evidentemente, sempre com a supervisão de um adulto capaz de acudí-la caso ela se engasgue. Com 1 ano, é hora de aprender a usar a colherzinha. Estimulá-la a  se alimentar sem a ajuda de um adulto favorece o desenvolvimento da coordenação motora. Conselho dos pediatras:   os pais devem evitar as broncas por causa da bagunça que o  filho faz ao comer sozinho. “As brigas podem trazer transtornos alimentares no futuro, pois a criança associa a hora da refeição a momentos estressantes”, diz o pediatra Pedro Paulo Corrêa, do Hospital São Luiz, em São Paulo.

Trocar a mamadeira pelo copinho

Quando: 1 ano
Por quê: “Com 1 ano, a criança já tem capacidade psicomotora para beber líquidos no copo com a ajuda de um adulto”, diz a pediatra Isabel Rey Madeira. Leite, chás, sucos e água podem ser oferecidos no copo de plástico – sem bico – já no fim do primeiro ano de vida. A utilização do copo, além de exercitar a autonomia, evita um dos efeitos mais perversos da mamadeira: seu uso prolongado pode contribuir para a obesidade. A praticidade da mamadeira, somada à sua associação a sensações de proteção e conforto, faz com que a criança se alimente mesmo quando não tem fome.

Largar a chupeta

Quando: até 2 anos
Por quê: antes dessa idade, o bebê está na chamada fase oral, e a chupeta de fato o acalma. Mas, quando os dentinhos começam a surgir, seu uso pode deformar a arcada dentária. “Esses danos, ao contrário do que se diz, não são irreversíveis, e em geral são corrigidos naturalmente quando a criança deixa de usar a chupeta – desde que isso não ocorra tarde demais”, diz Marcelo Bönecker, professor de odontopediatria da Universidade de São Paulo. A chupeta pode ainda retardar o processo de fala, ao comprometer os movimentos da língua e dos lábios – mas isso não é regra. O ideal é começar a restringir seu uso no fim do primeiro ano, permitindo-o somente em locais e horários estabelecidos, como em casa, na hora de dormir.

Deixar de usar fraldas

Quando: entre 2 e 4 anos
Por quê: quando está pronta para dispensar o uso da fralda, a criança costuma reclamar que está suja ou avisa que algo vai acontecer. Se ela passa a acordar mais seca e não molha algumas fraldas durante o dia, esse é um sinal de que aprendeu a segurar a vontade.
Aos 3 anos, 98% das crianças conseguem controlar o músculo que regula a saída da urina. Para que uma criança aprenda a usar o banheiro, ela precisa estar amadurecida física e psicologicamente, sob pena de enfrentar uma ansiedade para a qual não está preparada. Até os 5 anos, é normal que ela deixe escapar o xixi de vez em quando.

Comer o primeiro fast-food

Quando: a partir de 3 anos 
Por quê: não há como evitar – uma hora seu filho vai pedir o tal  hambúrguer com batata frita que vem com um brinquedinho. Não é preciso negar a novidade. O que se recomenda é bom senso: um lanche  desses pode ser saboreado uma vez ao mês sem nenhum problema. Mas,  em excesso, os fast-foods são perniciosos: aumentam o risco de  obesidade e hipertensão na fase adulta. Doces e frituras oferecidos em   festinhas podem ser consumidos a partir de 1 ano, sem exageros.

Escovar os dentes sozinho

Quando: a partir de 4 anos, com supervisão
Por quê: a higiene bucal começa assim que nascem os primeiros dentinhos. Ela deve ser feita com escova – a gaze não remove a placa bacteriana – e creme dental com flúor, importante na prevenção da cárie. Nos primeiros anos, a escovação deve ser acompanhada por um adulto, pois, até os 6 anos, as crianças têm maior tendência a ingerir o creme dental. O excesso de flúor no organismo provoca a fluorose, que produz manchas brancas ou castanhas nos dentes. “Só a partir dos 6 anos a criança tem coordenação motora suficiente para remover a placa bacteriana e controlar a deglutição”, explica Marcelo Bönecker.

Tomar banho sozinha

Quando: a partir de 6 anos
Por quê: antes disso, a criança pode se banhar sozinha – desde que um   adulto a ajude a passar o sabonete ou a espalhar o xampu nos cabelos. A   partir de 6 anos, a criança adquire a habilidade motora para se lavar   corretamente sem a ajuda de um adulto. Vale lembrar que a higiene    íntima  das meninas requer atenção redobrada da mãe nessa fase de    aprendizado.

Dormir na casa de um amiguinho

Quando: a partir de 6 anos
Por quê: nessa fase a criança já conquistou certa autonomia para tomar banho e escovar os dentes sozinha. Evidentemente, a decisão depende de  sua maturidade e grau de independência. “Os pais devem tomar cuidado para não pular etapas”, diz a psicóloga Vera Zimmermann, da  Universidade Federal de São Paulo. É essencial conhecer bem os adultos   que cuidarão do seu filho e o ambiente onde ele vai passar a noite.

Navegar na internet

Quando: a partir de 6 anos
Por quê: no início da alfabetização, a internet entra como um complemento das tarefas escolares. Mas ela não pode ocupar muitas horas do dia: os pais devem controlar o tempo que os filhos passam navegando na rede, batendo papo ou em joguinhos. É importante que acompanhem os sites e jogos preferidos do filho, inclusive dos adolescentes. “É como saber qual é a banda preferida dele ou que filme ele foi ver com os amigos”, diz Vera Zimmermann.

Ganhar um celular

Quando: a partir de 10 anos
Por quê: “Antes disso, ele é desnecessário. A criança vai passar  mais tempo brincando com os joguinhos do que usando o   celular para se comunicar”, diz a psicóloga Leila Salomão   Tardivo, do Instituto de Psicologia da Universidade de São   Paulo. O ideal é dar a ela um celular pré-pago e ensiná-la a   administrar o uso do aparelho. Cabe aos pais pagar os créditos para as ligações, mas a criança pode usar parte da mesada para complementá-los, desde que a decisão seja comunicada à família. Isso evita que ela deixe de lanchar na escola, por exemplo, para falar mais ao celular.

Receber mesada

Quando: a partir de 6 anos (semanal) e 14 anos (mensal)
Por quê: aos 6 anos, a criança vivencia as primeiras situações de consumo longe dos pais, como a compra de um lanche na cantina da escola. Mais importante do que o valor é a forma como ele será gasto. “Mesada não é prêmio, é um instrumento de educação”, diz o consultor financeiro Gustavo Cerbasi, autor de Filhos Inteligentes Enriquecem Sozinhos. “A criança deve prestar contas dos gastos e entender que ela é responsável por uma parte do orçamento da família”, acrescenta. Ela também pode ser estimulada a poupar, o que constitui um aprendizado útil sobre planejamento e autocontrole.

Ir sozinha para a escola

Quando: entre 13 e 14 anos
Por quê: quando a criança completa 11 anos, os pais devem acompanhá-la nos trajetos que ela fará sozinha em breve, seja de táxi, de ônibus ou a pé. Nessa fase, já podem ensinar algumas atitudes para ajudá-la a evitar situações de risco – como recusar carona de desconhecidos e andar, sempre que possível, na companhia de amigos.

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Dra. Vera Blondina Zimmermann
Dra. em Psicologia Clínica - PUC-SP, Professora afiliada do Departamento de Psiquiatria da Universidade Federal de São Paulo, Coordenadora do Núcleo Bebês com Sinais de Risco em Saúde Mental no mesmo departamento. Membro do Departamento de Psicanálise do Instituto SEDES SAPIENTIAE onde coordena o curso Clínica Interdisciplinar da Primeira infância.

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